sexta-feira, 7 de maio de 2010

Diário de um cabeçudo

Nasci em meio a muitas dificuldades, melhor dizendo, com muito esforço. Levei a falência o Hospital Santa Rosa, em Niterói, devido a enorme quantidade de faixa que foi utilizada para curar um ferimento na cabeça. O rombo nos cofres do hospital foi tão grande que ele nunca conseguiu quitar a dívida com a fábrica de faixa. Vinte anos após o meu nascimento o hospital não resistiu e faliu. Encarei uma série de processos por causa disso.

Cresci com dificuldade de andar, devido ao desequilíbrio cabeçal. Quando criança, jogando basquete, constantemente minha cabeça era quicada por confusão dos meus amigos. Minha mãe adorava o tamanho do meu crânio, pois não precisou comprar bolsa de feira. Ela usava o meu bonezinho para fazer as compras do mês. Com o tempo fiquei famoso e era conhecido por diversos nomes como: Moringa, racha-poste, maracanã, pirulito, fósforo, balão, cabeça-de-nós-todos, cabeça de jerimum, cabeça de alho entre outros.

Ainda na infância eu entrei pra uma banda marcial, na qual se usava um chapéu muito maneiro. Porém, não havia chapéu pro tamanho da jaca que eu possuía por sobre os ombros. Na primeira apresentação estavam presentes todos os meus familiares, equipados com câmeras e todo o arsenal para registrar aquele incrível “mico”. Eu consegui uma proeza: Tocar, marchar, e equilibrar o chapéu ao mesmo tempo. Mas tarde viram que aquilo estava ridículo e resolveram fazer um chapéu sob medida com 150 cm de diâmetro, ficou um pouco apertado, mas entrou.

Bem, eu cresci e finalmente descobri o meu espaço. Fui jogar futebol de índio (é aquele mesmo das cabeçadas). Bati o recorde do chute (cabeçada) mais forte. Cabeceava a 110 km/h (quase um Roberto Carlos com a cabeça).

Hoje eu sou líder do CA (Cabeças anônimas), onde ajudamos as enormes cabeças a lidar melhor com esse mundo preconceituoso para com nossas melancias. Também faço parte do projeto “Faça uma cabeça feliz”, onde fazemos campanhas para que as empresas de boné, chapéu, touca e outros objetos de por na cabeça, façam seus materiais com tamanhos compatíveis com nossas bigornas. Já conseguimos grandes avanços como alguns bonés e toucas com 1 m de diâmetro. Mas ainda não conseguimos atender a todos os portadores da MCLA (Massa Cefálica Levemente Avantajada). Mas estamos na luta. Enfim, essa é minha história e a de muitos também. Deixo aqui o meu apelo:

DIGA NÃO AO PRECONCEITO CABECEICO!

quinta-feira, 6 de maio de 2010


No meio da pedra não existe caminho.




Drummond

Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?